Atualizado em 06/12/2024
Tradução feita por
Fernanda Maranhão
Curitiba, 23/09/1973.
Cara Marjory
Vamos falar sobre os índios. Antigamente, em 1924 conheci o grupo dos Aimorés (Krenak) do Vale do Rio Doce no Espirito Santo. Era um grupo de índios com grandes discos de madeira no lábio inferior e nas orelhas, um grupo muito simpático que veio de Minas Gerais e se instalou junto a Lagoa de Juparanã. Uma vez reunidos, eles morreram todos.
Depois soube que os Kaingang do Paraná acabaram de ser destruídos, juntamente com outro grupo forte, os Aweikoma (Xokleng) ou botocudos catarinenses. Estive com os Karajá ou Hinan Son Uerá na ilha pantaneira do rio Araguaia, quando o Xingu (região desbravada pelos irmãos Villas Boas) foi infectado pelo sarampo. A região do Xingu eu visitei várias vezes - Os Kalapalo do mistério do Coronel Fawcett e as outras 7 tribos : Kamaiurá – Waujá – Yawalapiti- Mehinaku e outros como Nahukuá viviam em relativa paz, onde foi o início da fama de Villas Boas. Teve também o grupo Aweti, e conheci muitos Kaiabi. Depois estive com os Bororo algumas vezes no Mato Grosso e depois fui ver os Kuben-Kran-Kren quando lá estava com os Gorotire, os Xikrin e outros grupos Kayapó.
Quando lá no Maranhão fiquei uns 5 ou 6 meses com o povo Urubu ou Ka’apor, onde ainda havia dois grupos diferentes de índios, cujo nome não recordo no momento. Então eu fiquei com o Meitaje (Povo Gavião) no rio Tocantins. Claro que eu estive com o famoso cacique Apoena dos A’uwe ou Xavante na Serra do Roncador, considerado naquela época como sendo os índios mais ferozes do Brasil Central. Os Hetá (Xetá) que contatei em outubro ou novembro após meu retorno das aldeias Xavante em 1954. Conheci os Terena no sul de Mato Grosso, e não acredito que eles estejam vivos ainda hoje. Também estive com os Kaiowá do rio Paraná, quando fui filmar as araras com minha irmã Karla. Os Guarani com quem estive em quase todos os lugares do Paraná, onde hoje moram com os Kaingang.
Havia ainda vários grupos diferentes com os quais eu estive ou encontrei ocasionalmente, ou estava filmando com eles os mesmos temas, tanto quanto meu estoque de filmes permitia. Aqui eu estava filmando a confecção de sal de aguapé feita pelos índios Trumai, e estive com o grupo dos Juruna, além de estar com os Tapirapé e outros.
É claro que eu estava aqui apenas como um entusiasta, não como um missionário ou cientista ou como um explorador ou político. Todos os missionários, como eu vi, são apenas o instrumento de destruição destes homens da natureza e são uma grande quantidade de charmosos patifes doutrinadores – que de alguma forma estão destruindo o paraíso dos homens da natureza. Os cientistas às vezes ainda são idealistas no presente, todos aqueles milhões deles foram incapazes, com toda a sua ciência, de dizer aos políticos para conter a destruição da vida original e da natureza - talvez a única vida feliz dos povos primitivos. Assim como os missionários e os batalhões de cientistas são a vanguarda dos destruidores mudando a vida dessas pessoas felizes (se são felizes, não sei, ainda, não pediram a ninguém que viesse convertê-los ao budismo ou mohammedanismo ou cristianismo). Uma vez perguntei ao Horace Banner, um missionário inglês, o que diabos ele está vendendo para as pessoas simples. Ele me disse que os está preparando para o choque com a chegada da civilização. Então, em outras palavras, seria, que eles não protestassem, quando fossem expulsos do seu território, que lhes deu vida por milhares de anos, e deixassem os barões do aço tomarem suas terras sem protesto. Eles têm que ficar quietos, quando são levados para o confinamento, onde morrem de fome.
E eu mesmo? Fui ver os índios, pois sou da mesma espécie oprimida e nunca tive ajuda de parte alguma e fazia as excursões com suor, lágrimas e fome. Tive momentos difíceis, mas se me lembro agora, são as únicas coisas que valem a pena lembrar. Está tudo acabado e agora estou quase esquecendo esta aventura. Algum dia, se vivermos, posso lhe contar alguns dos incidentes ocorridos. Só me resta desejar boa sorte e pedir: Lembre-se sempre do velho amigo Kozák.